joão \ 2 anos

Saída do mercado, você no piloto automático, não do carro, da vida mesmo. Dirige a caminho de casa pensando no menu do jantar.

Até que… uma música do que parece ser milhões de anos atrás, da era de uma vida sem filhos. Um passado tão distante que te faz cogitar se ele realmente existiu.

Você para de pensar, afinal, não dá para desperdiçar esse vale a pena ver de novo com pensamentos. Pensar você já pensa o dia todo.

A brecha aberta da janela deixa um ventinho entrar, balançando os seus poucos fios de cabelo, os que restaram depois dos vinte meses de neblina (quem foi a desgraçada que escreveu 60?)

Você canta, dança e interpreta. Já nem se lembra de filho, marido, neblina, jantar.

Mas o som termina e vem a pergunta: cadê essa pessoa? Para onde foi essa versão de quem você era?

A cada filho que chega, colocamos a vida em pause. Pausamos por amor, pela conexão, pela adaptação. E tão fundamental quanto a pausa, é reconhecer o momento de apertar o play novamente. Por favor, não se deixe enganar, o tempo cura quase tudo, mas ele não é entregador de pizza, muito menos de transformação.

O passar dos anos não irá te cutucar: “Ei, é aqui que tem uma mulher querendo se reencontrar?” É preciso movimento! Dar o pontapé inicial e agir. Lutar não contra os outros, mas contra a pausa que acabou virando inércia. Se dar a chance de procurar os próprios pedaços.

Ao juntar os retalhos, você irá perceber que, mesmo faltando algumas partes, não há buracos. Há saudade, é diferente. Saudade é recompensa de um passado bem vivido.

A ausência de determinadas peças, dará lugar a peças novas, que você jamais imaginou ter. O resultado é como dar boas vindas a uma mulher que é ao mesmo tempo familiar e diferente, que foi moldada, lapidada e fortalecida.

E você percebe que, ao permitir que essa mulher ocupe de volta uma posição de destaque na própria vida, você não está tirando nada dos seus filhos. Na verdade, está devolvendo a você algo que foi, é e sempre será, só seu.

Autora: @rafaelacarvalhoescritora